Primeiro de Dezembro 2023
COP28: na contramão da transição energética
No ano mais quente da história da humanidade, onde todas as evidências cientificas mostram que nessa era do antropoceno, e significativamente nos últimos 50 anos, estamos condenando a humanidade às custas das próximas gerações, começou ontem 30/11, a 28ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas nos Emirados Árabes Unidos sob a presidência de quem comanda a Empresa Nacional de Petróleo de Abu Dhabi, conhecida como Adnoc. É a primeira vez que um CEO, ainda mais do setor de combustíveis fósseis, assume a presidência de uma COP. Esse cenário conta, também, com as tensões geopolíticas das guerras e das polarizações políticas no mundo todo. A vergonhosa ausência dos presidentes dos dois maiores emissores de gases de efeito estufa (China e EUA), também, colaboram para reduzir as expectativas dos resultados da COP28. Mesmo assim estou otimista, mesmo assim vejo luz no fim do túnel das próximas duas semanas. Meu otimismo se deve, em grande parte, pelo intenso engajamento da sociedade civil e da percepção, cada vez maior, de que governos, empresas e a ONU não conseguem fazer alguma coisa útil contra a mudança climática. Prova disso é a estúpida CPI das ONGs, que só consegue provar a idoneidade delas e fabricam inverdades para tentarem criar uma narrativa negativa. O pior é que tem gente que acredita!
O Brasil, que hoje assume a presidência do G20, tem um governo dividido entre os que estão trabalhando pela humanidade e os que estão trabalhando contra. Os discursos do presidente hoje não tocaram no ponto e deixaram (propositalmente) muitas dúvidas se o Brasil vai na direção de substituir (de verdade) os combustíveis fósseis ou incentivar a exploração de petróleo. Para piorar a boa imagem que o Brasil poderia ter na COP28, foram reveladas algumas barbaridades que deixaram o mundo perplexo diante desse governo paradoxal. A primeira foi a inclusão, na agenda verde, de um câncer (ex-jabuti) no projeto de lei que trata do marco regulatório das eólicas em alto-mar, incluindo a obrigatoriedade de contratação de térmicas a carvão. OI?????? A segunda foi a confirmação da entrada do Brasil na OPEP+ pelo ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira. Oi???? A outra notícia foi a aprovação da alteração do estatuto da Petrobras para permitir a entrada de políticos. Oi??? Ainda estamos traumatizados pelo Petrolão! A notícia da Braskem também não ajudou o Brasil nesses primeiros dois dias da COP28, um passo para frente dois para trás.
Os números de ontem (primeiro dia até 16h) foi um recorde de participação em COP. Foi anunciado pelo moderador Alexander Saier ao final do dia 930/11) na Conferência de Imprensa. Participaram: 52.081 delegados das partes, 19.132 observadores, 3.976 profissionais de imprensa, 84.000 virtualmente e 104.652 entre segurança e voluntários.
No primeiro dia celebraram a implantação do mecanismo de pagamento de Perdas e Danos. Seria uma ótima notícia se não fosse o valor irrisório anunciado. Menos de 5% do que já havia sido combinado para iniciar em 2020. Sei lá!
A boa notícia mesmo foi quando a ministra Marina Silva lançou hoje um projeto para pagamento de floresta em pé (viva), com a proposta de formação de um Fundo Florestal Tropical para Sempre) FFTS a partir da captação de recursos de outros fundos soberanos. A inovação é que, ao invés de recompensar pela massa de carbono da floresta, o pagamento seria por hectare preservado.
REGENERAÇÃO & ESG
Essa semana dei uma palestra na HSM+, junto com o Mauro Paradella (Mercado Livre) e o Rafael Gioelli (Gife) com o título “Regeneração: um impacto muito além da sustentabilidade”. Nossos esforços coletivos precisam enfatizar a adaptação e regeneração, não apenas a mitigação e a conservação. Esta nova mudança de paradigma requer que as organizações e comunidades façam a transição de um lugar de resposta reativa para uma postura proativa. Abordamos a importância do Triple Bottom Line, hoje ESG, para ações reais e sistêmicas dentro e fora da empresa. Não adianta falar é preciso fazer. Todo mundo sabe disso, não basta saber é preciso fazer. Ao invés de apenas reduzir o desmatamento, como podemos nos engajar ativamente no reflorestamento? Além de reduzir o uso e o desperdício de recursos naturais, como podemos projetar sistemas para circular materiais com perda mínima de valor? Mais do que monitorar e regulamentar as cadeias de abastecimento para impedir o trabalho infantil, como podemos encontrar uma maneira de educar as crianças e tirar famílias da pobreza? Usei na apresentação a capa da The Economist dessa semana (imagem acima) onde mostra de uma forma criativa, como se fosse um boletim escolar, as notas baixas que tiramos nos itens ligados às emergências climáticas: Investimentos, nota D; Renováveis, nota C+; Adaptação, nota D; Financiamento, incompleto; Cumprindo compromissos, nota D-; Assumindo Compromissos, nota B+. Ou seja, prometemos e não cumprimos, estamos muito aquém dos investimentos necessário e ainda não resolvemos as questões de financiamento climático. Só a parte das energias renováveis melhoraram um pouco apesar de muito distantes de reduzirem os combustíveis fósseis. Acredito que fomos reprovados, mais uma vez! Nesse contexto, “sustentar” o que temos não é mais suficiente. Precisamos nos adaptar ativamente à situação atual e trabalhar para minimizar o impacto inevitável das mudanças climáticas nas sociedades, economias e natureza. As notícias dos últimos dois dias são bem desanimadoras. Brasil na OPEP+, Braskem, Estatuto da Petrobras e por aí vai!
Enfatizei, também, algo que sempre me surpreende quando estou com executivos das empresas responsáveis pelas questões de sustentabilidade (ESG), que é a pouca familiaridade com a Carta da Terra. É bem chocante que não conheçam profundamente o documento que representa a nossa Constituição como humanidade. Por isso erram tanto e se diz tanta besteira sobre ESG. Vejam o preambulo da carta, em anexo, no final do artigo.
Como disse inicialmente o ESG é mais um desdobramento do Triple Bottom Line (TBL) criado há 30 anos pelo consultor de negócios britânico John Elkington, que desafiou as empresas que mediam seu desempenho apenas em termos financeiros, o famoso “bottom line” (resultado final) a ampliarem sua responsabilidade para além do resultado meramente econômico, olharem, também para os resultados sociais e ambientais. Assim, o Triple Bottom Line consistia em três Ps: Profit (Lucro), People (Pessoas) e Planet (Planeta). Esse olhar sistêmico abriu espaço para diversos relatórios de desempenho nas empresas. Sendo os mais utilizados: Global Reporting Initiative (GRI): Lançado em 1997, o GRI é um dos mais antigos e amplamente utilizados padrões para relatórios de sustentabilidade. Ele fornece um conjunto detalhado de indicadores que as empresas podem usar para reportar seu impacto ambiental, social e de governança. Carbon Disclosure Project (CDP): Fundado em 2000, o CDP foca especificamente na divulgação de informações relacionadas às mudanças climáticas, uso da água e desmatamento. Empresas são incentivadas a medir e divulgar seu impacto ambiental através deste projeto. United Nations Global Compact (UNGC): Lançado em 2000, o Pacto Global da ONU é uma iniciativa que encoraja empresas em todo o mundo a adotarem políticas sustentáveis e socialmente responsáveis. As empresas que aderem ao pacto devem emitir um relatório anual de sustentabilidade (Communication on Progress) que descreve seus esforços para implementar os princípios do pacto. Dow Jones Sustainability Index (DJSI) lançado em 1999 e FTSE4Good Index Series de 2001: Esses índices avaliam o desempenho de empresas com base no TBL e posteriormente em critérios ESG. Eles são usados por investidores que buscam empresas que demonstram responsabilidade em práticas ambientais, sociais e econômicas. ESG (Environmental, Social and Governance) em 2004 pela ONU: sistema de mensuração que tomou o mercado a partir de 2012, durante a Rio+20 e foi sendo utilizada como principal referência em sustentabilidade nas empresas. Seja para uma açõa verdadeira, seja para um “greenwashing”. Sustainability Accounting Standards Board (SASB): Fundado em 2011, o SASB desenvolve padrões de contabilidade de sustentabilidade específicos para a indústria, ajudando as empresas a identificar, gerenciar e reportar informações financeiramente materiais sobre sustentabilidade. Integrated Reporting Framework (2013): Desenvolvido pelo International Integrated Reporting Council (IIRC), esse framework promove a integração de informações financeiras e de sustentabilidade em um relatório coeso, refletindo a gama completa de fatores que afetam o desempenho corporativo. Task Force on Climate-related Financial Disclosures (TCFD): Estabelecida pelo Conselho de Estabilidade Financeira em 2015, a TCFD oferece recomendações para que as empresas divulguem informações claras, comparáveis e consistentes sobre os riscos e oportunidades relacionados ao clima.
O próprio John Elkington, em 2018, num artigo para Harvard Business Review disse que “A ideia original era ainda mais ampla, incentivando as empresas a monitorar e gerir o valor econômico (não apenas financeiro), social e ambiental agregado — ou destruído. Esta ideia gerou plataformas como a Global Reporting Initiative (GRI) e os Índices de Sustentabilidade Dow Jones (DJSI), influenciando a contabilidade empresarial, o envolvimento das partes interessadas e, cada vez mais, a estratégia. Mas o TBL não foi concebido para ser apenas uma ferramenta contábil. Era previsto provocar uma reflexão mais profunda sobre o capitalismo e o seu futuro, mas muitos dos primeiros a incorporá-lo entenderam o conceito como um ato de balanço, adotando uma mentalidade de trade-off.
Portanto hoje, independente dos critérios, nomes e sistemas de mensuração que você utilize em sua empresa, procure conscientizar os que ainda não estão vendo, agir de acordo com os compromissos assumidos (Walk the Talk) e buscar a regeneração em todas as áreas de atuação. Acredito muito na visão da sustentabilidade que ultrapassa as três tradicionais dimensões (Ambiental, Social e Econômica) e se ampliam com mais 4 dimensões: Cultural, Política, Ética e Estética. Essa visão foi sistematizada pela, mundialmente reconhecida, ambientalista Marina Silva. Ou seja, sustentabilidade é uma forma de ver e viver o mundo.
ISRAEL X Hamas
Os ataques terroristas bem-sucedidos contra a paz no Oriente Médio, no dia 7 de outubro de 2023, que mataram com requintes de crueldade e sadismo mais de 1.200 cidadãos em Israel, entre judeus, palestinos, muçulmanos, cristãos e estrangeiros, geraram mais reações do que todas as outras ações terroristas, genocídios e guerras deste século juntas. Os ataques do Hamas e a esperada resposta, acabaram conseguindo gerar instabilidade de paz para o mundo inteiro e um risco eminente de uma guerra numa escala mais global e armamentistamente bem mais perigosa. O mundo está completamente polarizado como se houvesse apenas dois lados, como se não fosse possível ver o todo. Por incrível que pareça a velha e empoeirada questão de esquerda e direita… voltou! As pessoas voltaram a falar delas como se realmente existissem, como se não houvéssemos já superado essa dicotomia. A questão do preconceito está presente de uma forma mais oculta nesse século 21, por ser politicamente incorreta ela se camufla de muitas maneiras. Quanto a propagação da violência, a grande maioria das pessoas reagem (ao invés de agir) aos algoritmos e escolhem um time para torcer sem a menor noção do que isso significa, sem a menor noção do que isso implica, sem a menor noção de nada… e posando de ativista da causa! Algumas poucas pessoas trabalham na direção de amplificar o ódio colocando fogo na floresta, fazendo guerras, passando a boiada, abrindo mais poços de petróleo, vendendo armas, aprovando veneno na comida, ajudando a eleger os Mileis do planeta. Por outro lado, existem, também, poucas pessoas trabalhando na direção da paz, fazendo do amor sua principal bandeira. Que a paz esteja convosco! Que o amor pelos nossos filhos seja maior do que o ódio pelos filhos dos outros.
Só lembrando que a invasão da Rússia na Ucrânia fez hoje 646 dias!
Efemérides
“Da COP passamos para a COPA
Também uma vergonha, um símbolo da corrupção e da “banalidade do mal” (conceito da Hannah Arendt) onde somos coniventes e até cumplices silenciosos de crimes. O famoso “Padrão FIFA”, que tentou parecer algo de qualidade, era na verdade uma poderosa máquina de manipulação e corrupção. Será que essa COPA do Qatar vai entrar para a história como as vergonhosas Copas de 1936 (Alemanha), 1978 (Argentina) e 2018 (Rússia)? Melhor parar por aqui em respeito aos torcedores. Independente do padrão FIFA de corrupção, essa COPA permitiu que todos os brasileiros voltassem a vestir a camisa e torcer pelo Brasil. Um alívio depois de um longo período de hackeamento dos símbolos nacionais e da camisa da seleção brasileira. Será que agora poderemos colocar a palavra Amor na bandeira como originalmente deveria ter sido? Após da Proclamação da República as palavras da bandeira foram inspiradas no lema positivista do filósofo francês, Augusto Comte, que ressalta “o amor por princípio, a ordem por base e o progresso por fim”. O amor acabou sendo cortado na ocasião. Quem sabe podemos reparar isso hoje!”
1º de dezembro 2021
“Será que depois de 20 meses de pandemia continuamos a acreditar no inacreditável e nos comportar da mesma maneira? O pior que pode nos acontecer é voltarmos ao que éramos em 2019 e, no entanto, muita gente está procurando caminhar para essa direção. Voltar ao normal ou para um novo normal, não é normal… é Normose! Normose é “um conjunto de hábitos considerados normais pelo consenso social que, na realidade, são patogênicos e nos levam à infelicidade, à doença e à perda de sentido na vida”, essa patologia é definida por Roberto Crema, Jean-Yves Leloup e Pierre Weil em seu livro — Normose: A patologia da normalidade — veja o TED do Roberto Crema que recomendei em outubro do ano passado: http://bit.ly/TEDnormose”
“Estamos entrando no último mês da segunda década do século XXI. Onde estamos? Sabemos quem somos individualmente e ou coletivamente? Temos alguma ideia de como será o caminho civilizatório da terceira década deste século, que começa em janeiro? O que aprendemos em 2020? O que mudou? Quais são as verdades que adquirimos, quais foram ressignificadas e quais foram confirmadas?
Todas essas verdades são a nossa necessidade de ter explicações para tudo. Por que precisamos de explicações? Por que acreditamos nas explicações? Será que escolhemos em quais explicações acreditar ou somos levados a acreditar? Por que acreditamos em apenas uma das explicações?
Conforme prometido em minha carta do mês passado, vou trazer alguns exemplos para cutucar nossas verdades.
Antes de começar quero repetir o que o Arthur Schopenhauer disse:
“Toda verdade passa por três estágios.
No primeiro, ela é ridicularizada.
No segundo, é rejeitada com violência.
No terceiro, é aceita como evidente por si própria”
Para não entrar em questões como a de que a Terra é plana ou redonda, nem se comer animais faz bem ou mal, vamos escolher um tema atual que não sai da pauta geral da humanidade deste ano: a pandemia! Vamos questionar… apenas questionar, nossas atuais verdades sobre a pandemia. Apenas um exercício que pode nos exemplificar como tudo é uma questão de percepção.”
Anexo: Preambulo da Carta da Terra (início)
Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo se torna cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio de uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações.
Leia e releia!