Primeiro de Janeiro 2025

Alan Dubner
5 min readJan 1, 2025

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A REALIDADE REAL

A Realidade Real

A maioria das pessoas acredita que a sua realidade é a realidade real e julga os outros como se estivessem, também, vivendo nessa mesma realidade.

No entanto cada pessoa vive na sua própria realidade desavisada de que não é a mesma dos outros

Criam-se regras para que a civilização possa conviver entre as diferentes realidades sem se machucarem. Apesar de ser uma boa ideia, essas regras foram sendo estabelecidas para atender e manter os que estão no poder. Com isso esse código de conduta imaginário machuca aqueles que não se submetem, como um todo, à manutenção dos que estão no poder.

Entre as formas de conseguir o feito de manter todas essas realidades dentro de um mesmo padrão aparente é através do artifício da narrativa. Cria-se uma história ficcional, que cabe mais ou menos na realidade de cada um. Trata-se de uma realidade paralela às nossas que, coletivamente, definimos como… a certa!

Isso só é possível porque nossa mente é facilmente sugestionável. Todos nós somos sugestionáveis! Cada pessoa tem propensão a se sugestionar mais numa área do que em outra. Seja na saúde, segurança, religião, relacionamentos ou em qualquer outra. Cada pessoa tem propensão a ser mais sugestionável do que as outras. Ao contrário do que se acredita, ser sugestionável independe da inteligência. Pessoas muito inteligentes, também, acreditam em coisas inacreditáveis.

Nossa humanidade já passou por muitas civilizações. Elas nasceram baseadas num conjunto de crenças ficcionais, que originalmente foram criadas para sobreviverem em comunidade. Depois foram se sofisticando para atenderem a manutenção e vontade dos que a estão dominando. Com o tempo o sistema criado artificialmente para atender poucos não se sustenta e colapsa.

Nossa civilização atual está numa crise aguda. A questão, difícil de responder, é saber em que estágio estamos. Como tudo na vida, as civilizações nascem, vivem e morrem. Seria ingênuo acreditar que a nossa civilização vai existir para sempre. Tão ingênuo quanto acreditar que não iremos morrer. Sabemos que vamos morrer e ao mesmo tempo vivemos como se não fôssemos. Sabemos que estamos numa crise civilizatória e ao mesmo tempo escolhemos acreditar em narrativas que dizem que não estamos. Preferimos fingir coletivamente que os dirigentes, escolhidos por nós, estão no caminho certo… mesmo sabendo que não estão. Pois é… não é fácil ser humano!

Portanto, a nossa Realidade Real é aquela que acreditamos existir e pautamos nossa vida baseada nela.

Acreditamos no que pensamos saber, acreditamos no que sabemos que não sabemos, acreditamos no que se convencionou acreditar, acreditamos, sem o menor constrangimento, no inacreditável.

Acreditar no que pensamos saber é fácil. Nos convencemos, através de informações e histórias (narrativas) de que conhecemos o assunto e portanto nossa visão está, confirmadamente, correta. Agimos baseados nessas crenças.

Acreditar no que sabemos que não sabemos, exige um sistema cognitivo mais sofisticado para que possamos seguir acreditando sem precisar questionar essas crenças. A maior parte de nossas crenças estão nesse item e não nos damos conta. Quem sabe realmente o que é o PIB (Produto Interno Bruto), CO2 (dióxido de carbono), Coronavírus (SARS-CoV-2), IA (inteligência artificial), Democracia e outras centenas de saberes que usamos cotidianamente? A tendência inicial é dizer que sabemos, mas se pedir para explicar percebemos que não sabemos. No entanto acreditamos, pelos mais diversos motivos, no que não sabemos.

Acreditamos no que se convencionou acreditar. Existe um combinado coletivo que seguimos sem muitas restrições. Apenas seguimos!

A começar pelo tempo em que definimos que os milênios tem mil anos cada, os séculos 100, os anos 365 dias mais um há cada quatro, o dia em 24 horas, a hora em 60 minutos e os minutos tem 60 segundos e os segundos podem ser divididos em milissegundos, microssegundo, nanossegundo e assim por diante infinitamente. Como pode ficarmos tão dependentes de algo que criamos para… facilitar a vida.

Os países são formados por linhas imaginárias que foram sendo definidas e alteradas ao longo da história. Estados e cidades, também, são invenções nossas. Seria possível convivermos sem fronteiras? Seria desejável redesenhar essas fronteiras? Já nascemos com essas linhas colocadas como fato consumado. Como pode ficarmos tão presos às linhas imaginárias que criamos para… nos separarmos.

A criação e manutenção da crença no dinheiro é certamente o melhor exemplo da aceitação e obediência coletiva, mesmo com todas nossas idiossincrasias.

Acreditamos no inacreditável. Isso só é possível graças a nossa capacidade de sermos sugestionáveis. Mas quem acredita no inacreditável? O outro! É sempre o outro que acredita em coisas que não existem! A nossa realidade é a realidade real e fica difícil entender por que existem outros que acreditam em coisas tão diferentes. Tem gente que acredita que a Terra é redonda, tem outros que não. Tem gente que acredita em discos voadores, tem outros que não. Tem gente que acredita em alma gêmea, tem outros que não. Tem gente que acredita em anjos, tem outros que não. Tem gente que acredita em pesquisas eleitorais, tem outros que não. Tem gente que acredita em notícias, tem outros que não. Tem gente que acredita no outro, tem outros que não. A lista é gigantesca e dentro de cada crença tem ainda muitas nuances que diferenciam um acreditar do outro. Porém todo mundo acredita no tempo, nos países, no dinheiro…

Joseph Campbel, em uma ocasião lhe perguntaram o que era Mitologia, brilhantemente respondeu: É a religião dos outros!

Quero concluir sobre a “Realidade Real” de que essa realidade é a somatória de todas as realidades. Ela existe como coletivo. Ela somos nós e nós somos interdependentes. Somos um! Isso não é inacreditável? Eu acredito!

Recomendo dois livros muito bons sobre as questões do “acreditar”. O primeiro é o Biologia da Crença (Biology of Belief) do Bruce Lipton. O livro já tem quase 20 anos. Fizeram uma atualização em 2016, com as novas descobertas científicas e espero que façam outra no ano que vem. O segundo é o recente “The Suggestible Brain” do Amir Raz que descreve maravilhosamente bem como funciona os mecanismos de sugestão da nossa mente e como fazer para nos proteger.

P.S. A palavra Acreditar tem sua origem no francês “Accréditer” que significa dar crédito a alguém, entregar um valor para alguém em confiança. Sua origem vem do Latim “credere” que significa “crer” ou “ter fé”. O prefixo “a” sugere um movimento em direção a crença, reforça a ideia de se mover (se inclinar) em direção a uma convicção. Atualmente, em nosso idioma, acreditar significa convencer-se da veracidade do que o outro diz, aceitar ou manter como verdadeiro algo que não é necessariamente provado ou apoiado por evidências. Em francês a palavra para isso é “croire” e em inglês “believe”.

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Alan Dubner
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Written by Alan Dubner

Consultoria em Sistemas de Aprendizagem e Educação para Sustentabilidade

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