Primeiro de Julho

Alan Dubner
8 min readJul 2, 2022

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Luz no fim do Túnel?

Esse mês de junho foi muito… muito intenso. Foi um daqueles meses que parecem um ano inteiro. A começar que estou escrevendo essas linhas com covid no meu organismo, testei positivo há três dias.

Desinformação

Quanto ao covid19, me lembro de várias vezes ter escrito questionando nossa percepção em relação aos números publicados por cada país, aos tratamentos recomendados, a origem do vírus, a eficácia de cada vacina, as medidas de prevenção, compensações econômicas, benefícios escusos, políticas antiéticas e as decretações do fim da pandemia, começando pela Dinamarca no dia primeiro de fevereiro desse ano. Passados dois anos e meio continuamos sem respostas para nenhuma dessas questões e as divergências são tão antagônicas quanto (ambas) cientificamente comprovadas. Resta ao cidadão se conscientizar de que não existe o certo e o errado e sim a falta de informação, a desinformação e a informação. Sendo a desinformação a mais usual, porque é atraente para quem lê, vem travestida de informação, gera muitos negócios e tem a garantia de impunidade para quem a produz. A falta de informação não é atraente, reflete um certo fracasso, gera demanda por informação (geralmente preenchida, oportunisticamente, por desinformação) e ao seu favor conta apenas a honestidade. Quanto a informação é uma joia rara que se confunde facilmente com bijuteria. A informação é geralmente mais inacreditável do que a desinformação, não tem apelo (appeal) e a narrativa (por não ter sido construída) não cola. Portanto estamos bem, correto? Bem mal!

A arte da desinformação tem método, intenção e patrocínio. Ela não é nova, sempre existiu. Para que ela funcione bem é preciso que por um lado se anuncie que o rei nu está vestido e por outro oferecer pão e circo. A vantagem que a desinformação tem é que a grande maioria acredita e deixa quem não acredita numa situação constrangedora.

Uma das estratégias, hoje bem conhecida é de após fabricar essas fake news, eles procuram espalhar através dos seus milhares de micro funcionários para tentarem se destacar junto aos chamados “inocentes uteis”. Eles são em geral os influencers (influenciadores) que na verdade são apenas intermediários. Eles não produzem notícias, repassam aquelas que estão “bombando”. Com isso o público deles (cada vez maior) tem a sensação de que são eles que fizeram a notícia “bombar”. Tem muitas outras estratégias conhecidas.

O caso da desinformação sobre o ator francês, Alain Delon, ter decidido realizar seu suicídio assistido divulgado em abril desse ano no mundo inteiro, ajuda a ilustrar essa ideia. Foi uma fake news, como tantas, que fez centenas de milhares de fãs acreditarem que ele tinha morrido e ou que tinha marcado seu suicídio com o acompanhamento do seu filho. A fabricação é simples, alguém pegou um trecho de uma entrevista dele e outra do filho e tirou completamente do contexto, acrescentaram que o ator se mudou para a Suíça porque lá a eutanásia é legalizada. O resto da mídia foi na onda e replicou a bobagem, o assunto viralizou nas redes sociais e até hoje tem gente acreditando que isso seja verdade. As vezes acontece um acidente como no jornal Folha de São Paulo que no dia 11 de abril (e não 1º de abril) anunciou, na internet, a morte da Rainha Elizabeth: “Morre Elizabeth 2ª, a mais longeva rainha da história britânica, aos XX” com o subtítulo: “Discreta, soberana deixa como maior legado confiança na monarquia”. A situação viralizou nas mídias sociais em que os títulos eram versões de “Folha Mata Rainha da Inglaterra”. Nesse caso da Folha, não foi uma desinformação deliberadamente montada, na verdade é um caso de falta de informação — não sabemos como e porque ocorreu essa gafe. Tudo bem!

Bruno Pereira e Dom Phillips

No dia primeiro de junho, eu estava conduzindo uma conversa num evento híbrido paralelo a Stockholm+50 pela SOL (Society for Organizational Learning) de Estocolmo. A conversa foi com o líder indígena Almir Suruí (Rondônia) e uma inédita visita virtual a aldeia Maronal, no Vale do Javari, onde o Cacique Alfredo Maronal descrevia para o publico em Estocolmo e no Zoom as principais ameaças à vida dos povos locais e à floresta Amazônica. A situação descrita (in loco) chocou os participantes estrangeiros a nossa realidade. Parecia tão inacreditável, que muitos confessaram depois, achavam que estavam exagerando. Não era possível, nos dias de hoje, que isso fosse permitido e pior… até incentivado. Quatro dias depois — simbolicamente — no dia 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, definido por causa do primeiro evento internacional sobre o meio ambiente há exatos 50 anos em Estocolmo, desaparecem dois importantíssimos ativistas da causa humanitária, exatamente na região próxima a aldeia Maronal, no mesmo rio (Ituí/Itaquaí) e na mesma cidade (Atalaia do Norte) mencionada pelo cacique Alfredo. Aliás, Bruno e Dom estavam em Atalaia do Norte nesse mesmo dia 1º enquanto, próximo dali, estávamos numa roda de conversa híbrida com cerca de 40 pessoas de 15 países diferentes. O jornalista inglês Dom Phillips estava entrevistando lideranças indígenas para seu livro “Como Salvar a Amazônia”.

Foi só na segunda-feira, dia 6, que o mundo acordou com a notícia do desaparecimento e durante a semana uma parte do mundo acordou para a (ir)realidade dos crimes contra a humanidade cometidos na Amazônia. O que se seguiu e continua até hoje são cenas do horror que os povos da floresta vêm enfrentando, principalmente, nesses mais de três anos.

Esse encontro que conduzi em Estocolmo contou a ajuda de muita gente e principalmente com a FAS (Fundação Amazonia Sustentável) liderada pelo amigo Virgílio Viana que vem, entre tantas outras coisas, viabilizando pontos de inclusão digital nos pontos mais remotos da floresta Amazônica e da indígena Rosa dos Anjos responsável pela área indígena da FAS, amiga de Bruno Pereira. Essa empreitada parecia tão impossível, principalmente porque nunca tinham feito uma comunicação por Zoom e não estavam conseguindo se conectar. No dia anterior tentamos fazer um teste, fiquei com a sala aberta aguardando que pudessem conseguir entrar. Até as 23h não tinham conseguido e não havia como me comunicar com eles. Para completar recebi a informação que a Txai Suruí não tinha conseguido embarcar no translado e que não chegaria a tempo em Estocolmo para participar com a Adri Maffioletti que ia ser (e foi) a host e tradutora no lado presencial em Estocolmo. Fui dormir pensando no texto que mandaria avisando que não ia rolar o encontro. Logo cedo, cedo mesmo porque as atividades começavam em Estocolmo às 9h (4 da manhã no Brasil) o Zoom me mandou uma mensagem que tentaram entrar a meia noite na sala, ou seja, havia esperanças e para melhorar ainda mais o Cacique Almir Suruí se ofereceu para participar substituindo sua filha Txai. Estava parecendo que conseguiríamos realizar essa façanha. A Adri Maffioletti foi uma host maravilhosa, transbordou simpatia, alegria, competência na tradução para o inglês, conhecimento profundo da causa indígena brasileira principalmente da necessidade de um ativismo mundial da qual é uma das expoentes do Fridays for Future e MAPA (Most Affected People and Areas). Recebemos, no dia do evento, um vídeo com depoimento do líder Pedro Marubo em sua língua nativa:

Depoimento de Pedro Tamasaimpa Marubo fala: “Nós defendemos a nossa floresta e nosso território não é simplesmente para morar. Ela nos oferece recursos naturais como por exemplo: Ervas e plantas medicinais, lagos, igarapés e matas que nos oferece peixes, caças sem fim. Por esta razão, defendemos nosso chão porque, a terra para nós povos indígenas é o melhor que governo, ela nos dar tudo que precisamos. Enquanto governo nos tira nossa terra apoiando garimpo, fazendeiros e madeireiros. A chegada da internet na nossa aldeia é muito importante para todos nós. Os nossos filhos terão conhecimento científico-tecnológico do homem branco e vamos juntar com nossos conhecimentos tradicionais nós também participaremos das reuniões que acontecerão longe nas cidades através de videoconferências e outros assuntos do nosso interesse que serão discutidos pelos políticos muitas vezes homem branco discutem sem a nossa participação agora podemos falar direto da nossa aldeia sem ter que sair, vocês chegam até nós para nos ouvir e buscar nos ajudar.”

Sugiro fortemente que vejam esses importantes links para entrarem mais profundamente nas questões sistêmicas rodeando Bruno e Dom.

The Guardian em inglês (entrem também nos links)

Agência Pública (vários artigos)

Vozes do Planeta (Paulina Chamorro)

Roda Viva (Sydney Possuelo):

Stockholm+50

Provavelmente a Suécia, num futuro muito próximo, vai se envergonhar profundamente do que fez e principalmente do que não fez nesse evento que deveria ter sido o mais significativo dessa década. Ela conseguiu desmobilizar de tal maneira que se torna quase impossível tirar alguma coisa de boa dela. Acompanhei integralmente ao vivo no dia 2 e 3 de junho (as datas já são parte da vergonha) e fui vendo as gravações ao longo da semana seguinte. O país de Greta Thunberg e de Johan Rockström não poderia ter feito isso com a memória da Estocolmo 1972 e dos 50 anos de tudo que foi gerado de encontros, documentos, decisões e acordos de sustentabilidade. A reunião preparatória de 28 de março na ONU em Nova York já anunciava o fracasso e não teve qualquer esforço de minimizar (ou mitigar) os resultados negativos. Como todo evento da ONU, o que fez valer a pena de ir a Estocolmo foram os eventos não oficiais promovidos pela sociedade civil. Parece que depois de 50 anos ainda não aprendemos de que a ONU, os governos e as empresas não deveriam mais serem convidadas a participarem de encontros tão importantes. Há honrosas exceções como o Protocolo de Montreal e outros que geraram resultados. Num dos eventos laterais que participei era sobre porque as ODS não emplacaram e suas implicações na política. Esse mês deve sair um livro sobre um estudo profundo apresentado no evento “The Political Impact of the Sustainable Development Goals“ lançado pela Cambridge University Press e pode ser baixado gratuitamente.

Os jovens e os povos originários foram os responsáveis pelas principais atrações e movimentos ativistas. Esperamos que tenhamos melhor aproveitamento na nossa Cúpula dos Povos na Rio+30 em outubro desse ano.

Tempo Quente

Um dos grandes presentes de junho foi o lançamento do Podcast “Tempo Quente” (Radio Novelo) que foi lançado em 7 de junho com o episódio “Alerta Vermelho” e a inacreditável história do “carvão mineral sustentável” contada deliciosamente pela jornalista Giovana Girardi.

https://www.radionovelo.com.br/tempoquente

No episódio dessa semana “Amazonia sitiada”, sem dar spoiler tem uma deliciosa linha do tempo contada com amor, humor e responsabilidade socioambiental. Adorei a mini participação do Tasso Azevedo (MapBiomas) e do Claudio Angelo (Observatório do Clima)

Gostei também da Giovana ter colocado o Delfim Neto no local que ele merece ao invés de reverenciá-lo, como o fazem algumas mídias. Uma das pérolas ditas por ele é de que “a Trans Amazônica é a coisa mais fake news que já se construiu no Brasil”. Olha só quem fala!

Vida longa ao Tempo Quente!

Luz no fim do túnel nas eleições 2022

Depois de tantos mandos e desmandos para sistematicamente destruir a democracia, acredito que podemos vislumbrar alguma luz no fim desse escuro, violento e corrupto túnel. O assunto não poderia ser eleição presidencial, não há o que dizer apesar de todos não pararem de falar.

Amanhã, 2 de julho, o Meio Ambiente tem o prazer de anunciar a pré-candidatura de Marina Silva para Deputada Federal por São Paulo. Quem for de outro estado, pode contribuir pedindo a um amigo ou parente de São Paulo votar nela. Além de Marina Silva existem outros que defendem a democracia e a pauta socioambiental. Esperamos que tenhamos cada vez mais bons políticos eleitos.

Espero que políticos como os que estão causando os problemas na Amazônia, por terem aberto a porteira aproveitando a pandemia, recebam poucos votos.

Enquanto isso…

Presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, bem próximo ao presidente da república é acusado de assédio sexual e pede rapidamente demissão.

O ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro foi preso.

Na Colômbia, Gustavo Petro, vence a eleição. Uma esperança?

Encontro do G7 nos Alpes da Bavária (Alemanha)

128 dias de invasão Russa na Ucrânia

Terremoto no Afeganistão

Greta Thunberg aparece de surpresa no Festival de Glastonbury

Terminou ontem a Cúpula da OTAN

Mesmo com tudo isso vemos uma luz no fim do túnel… só esperançamos de que não seja um trem!

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Alan Dubner

Consultoria em Sistemas de Aprendizagem e Educação para Sustentabilidade